ARTIGO
PUBLICADO EM: ANAIS DO ENTAC 2004, SÃO PAULO, 2004
ADENSAMENTO HORIZONTAL COMO ALTERNATIVA TIPOLÓGICA
HABITACIONAL E URBANA
ROSSI, Angela Maria Gabriella (1); BASSALO,
José (2);
ANDRADE, Paulo (3); MELLO, Fabio (4)
(1) Programa de Pós-Graduação em Arquitetura
da FAU/UFRJ, gabriella.rossi@ufrj.br
(2) Departamento de Arquitetura e Urbanismo da UFPA, jbassalo@amazon.com.br
(3) Programa de Pós-Graduação em Arquitetura
da FAU/UFRJ, pandrade@amazon.com.br
(4) Programa de Pós-Graduação em Arquitetura
da FAU/UFRJ, fabiomello@superig.com.br
RESUMO
Este trabalho
tem por objetivo estudar o conceito de adensamento horizontal
como uma alternativa satisfatória na definição
de tipologias habitacionais e urbanas para empreendimentos
destinados a uma população de menor renda, em
que é necessário favorecer tanto a qualidade
do espaço como a economia de área. A verticalização
tem sido uma solução tipológica amplamente
adotada nas cidades brasileiras; no entanto, a adoção
de edifícios baixos adensados também pode proporcionar
bons resultados.
A metodologia
a ser utilizada para desenvolver este estudo partirá
de um aprofundamento teórico sobre as características
de uma tipologia habitacional e urbana baseada no adensamento
horizontal. A seguir, serão descritos e analisados
dois empreendimentos habitacionais recentemente realizados
na cidade de Belém do Pará, um deles com tipologia
vertical e outro com tipologia horizontal, para a comparação
das áreas utilizadas e a qualidade dos espaços
público, semi-público e privado.
Os resultados
esperados permitirão demonstrar que o adensamento horizontal
pode resultar em espaços de boa qualidade de moradia
e ainda favorecer o desenvolvimento de uma cidade mais compacta,
com uma ocupação do solo, infra-estrutura e
serviços públicos mais racionalizados.
Palavras-chave:
habitação, tipologias arquitetônicas,
tipologias urbanas, adensamento horizontal.
1.
INTRODUÇÃO
Nas últimas
décadas, a maioria das circunstanciais propostas governamentais
para a redução do déficit habitacional,
voltou-se para o seu lado quantitativo, buscando maximizar
o número de unidades construídas. Entretanto,
muitas vezes, no afã de produzir numéricas alterações
estatísticas, as ações públicas
têm agravado o aspecto qualitativo do problema. Gigantescos
conjuntos habitacionais, concebidos por esse tipo de política,
raramente proporcionam boa qualidade de vida aos seus moradores,
comprometendo, por exemplo, a salubridade social, dificultando,
entre outras coisas, as relações humanas circunscritas
a esses complexos. Além do mais, a desmedida escala
de tais conjuntos obriga suas implantações nas
periferias das cidades, os únicos locais a disporem
de glebas com extensões suficientes para abrigarem
aquelas estruturas, entretanto em pontos de baixa acessibilidade.
Como se observa,
esses tipos de ação, embora diminuam a conta
das lacunas habitacionais, pouco contribuem para o progresso
social da população como um todo, pois a eventual
inconveniência espacial colabora, também, para
o desenvolvimento de outros problemas, os quais fogem ao escopo
dessas reflexões.
Nos últimos
anos, porém, o conceito que determina as atuações
oficiais no setor em questão vem adquirindo nova feição,
a nosso ver mais correta, pois buscam a redução
não apenas quantitativa, mas, também, qualitativa
do déficit habitacional. Recentemente, as moradias
construídas pelo poder público, traduzem, por
meio de suas características físicas e locacionais,
preocupações com o conforto físico e
social de seus residentes.
O termo habitação
social, à primeira vista, remete à idéia
de unidades caracterizadas pela essencial exigüidade
física e destinadas a famílias em situação
de risco. Entretanto, a nosso ver, o cunho social das moradias
não reside em seus atributos materiais, e sim na filosofia
das políticas que as disponibilizam para a população.
Essas práticas, acreditamos, assumem tal caráter
pois oferecem o acesso de determinada classe populacional
a habitações que estão além de
suas posses financeiras.
O Conjunto
Residencial Jardim Jaçanã e o Conjunto Habitacional
Ulisses Guimarães, aqui apresentados, são produtos
de um programa governamental no campo habitacional, concebido
para colocar ao alcance de um grande segmento da população,
a moradia em condições dignas de habitabilidade.
2.
ADENSAMENTO HORIZONTAL E SUA RELAÇÃO COM O ESPAÇO
PÚBLICO, SEMI-PUBLICO E PRIVADO
A noção
de “adensamento” pressupõe a necessidade
de se construir um maior número de unidades habitacionais
em um terreno menor possível, de modo a viabilizar
economicamente a produção de habitações
para população de menor renda. Este adensamento
tem sido obtido, no Brasil, através da verticalização,
inclusive para faixas de população de maior
renda. Para as faixas mais pobres, porém, a verticalização
tem sido realizada sem levar em consideração
um aspecto relevante para a produção de um espaço
socialmente bem resolvido, ou seja, a harmonização
entre os espaços público, semi-público
e privado e sua consequente harmonização entre
áreas verdes, áreas coletivas e áreas
de lazer (ROSSI, 1999).
Desde a Revolução
Industrial, em que as habitações deixaram de
ter espaços destinados ao trabalho, as cidades têm
experimentado várias formas de planejamento, quase
sempre baseadas na separação de funções,
como, por exemplo, a Cité Industrielle de Le Corbusier
e as Cidades-Jardim de Ebenezer Howard. Estas idéias
têm influenciado intensamente os modelos dos conjuntos
habitacionais produzidos no mundo todo e que resultaram em
espaços socialmente insalubres, segregados e anônimos.
Somente a partir da segunda metade do século XX, tendo
em vista o vandalismo que ocorria nestes conjuntos, é
que se iniciaram, na Europa, as pesquisas sobre a mistura
de funções, tendo em vista a hipótese
de que a separação das funções
da cidade ocasionava espaços monofuncionais, pobres
em diversidade, e por isso pouco vividos e experimentados
pelas pessoas. A mistura de funções, pelo contrário,
estimularia a pluralidade de atividades no espaço público
e promoveria um uso mais intenso do espaço e uma maior
comunicação entre as pessoas, o que consequentemente
levaria a uma maior segurança e maior identificação
do morador com seu conjunto e seu bairro circundante (BOTT,
HAAS, 1996).
O relacionamento
da unidade habitacional e seu morador com a área circundante
depende do projeto das áreas públicas, semi-públicas
e privadas. A arquitetura, dessa forma, pode produzir espaços
que promovam integração com a vizinhança
tanto quanto espaços que promovam um certo anonimato
e a segregação. Os elementos arquitetônicos
que favorecem a primeira opção são principalmente
os pátios, os jardins e as ruas internas ao conjunto,
assim como as áreas de encontro e lazer para os três
ciclos de vida do ser humano: infância, adolescência
e idade adulta, com atenção especial para a
terceira idade.
Um exemplo
interessante que comprova as afirmações acima
está no conjunto Römerstadt, em Frankfurt, Alemanha,
projetado por Ernst May em 1927-28, que ensina que plantas
monótonas de loteamento, resultantes de orçamentos
limitados, podem ser transformados em um excelente ambiente
de moradia, dependendo é claro do projeto elaborado
(HERTZBERGER, 1999).
Fonte: HERTZBERGER, 1999.
Figura 1 – Römerstadt, Frankfurt, Alemanha, 1927-28,
projetado por Ernst May
Mais recentemente,
na própria Alemanha, no final do século XX,
ao planejar a produção habitacional para atender
à demanda social surgida com a queda do muro de Berlim,
as diversas políticas habitacionais fomentaram experimentos
com o intuito de buscar entender que tipo de adensamento seria
favorável a uma qualidade de vida mais satisfatória
que a dos conjuntos habitacionais dos anos 60 e 70 do mesmo
século. As pesquisas e experimentos revelaram a validade
dos modelos do início do século, surgidos a
partir das vilas operárias, que apresentavam os elementos
da cidade tradicional, como a praça, a rua de convivência
e não só de passagem, os jardins privados e
o baixo gabarito.
Como exemplo
dessa tendência de adensamento horizontal, podem ser
citados dois conjuntos habitacionais construídos na
Baviera, Alemanha. O primeiro, denominado Neustift, foi construído
em 1989 e recebeu dois prêmios. O projeto das casas
de 2 a 3 pavimentos foi desenvolvido em terrenos de pequenas
dimensões, possuindo 3,90m de largura e 13,90 de profundidade.
São 24 casas unifamiliares em 2 fitas, uma em frente
à outra, resultando, desse grupamento, uma área
central, com significado de espaço coletivo e de reunião.
A área habitacional foi projetada para ficar livre
dos automóveis.
Figura 2 –
Neustift, Baviera, Alemanha, 1989, projetado por Sampo Widmann
e Hermann Schröder
O segundo
conjunto habitacional a ser exemplificado denomina-se Permoserstrasse
e constitui-se em 12 edifícios de 3 pavimentos, agrupados
dois a dois, e ligados por uma escada aberta, porém
coberta, que dá acesso a 4 unidades por pavimento.
Essa implantação forma tranqüilos pátios
internos, com jardins privados junto aos edifícios,
além de uma praça central.
Figura 3 –
Permoserstrasse, Baviera, Alemanha, 1994, projetado por Sampo
Widmann e Hermann Schröder
Os dois exemplos
acima são, portanto, modelos construídos em
época recente, com financiamento público, apresentando
densidade alta, horizontalidade, e bom projeto de áreas
livres privadas e semi-públicas e espaços coletivos,
além do estacionamento marginal ao terreno, fazendo
com que o conjunto pudesse ficar livre do tráfego de
automóveis.
No Brasil,
conforme mencionado anteriormente, também têm
sido realizadas algumas experiências que adotaram satisfatoriamente
o modelo de adensamento horizontal com uma valorização
de seu espaço público, semi-público e
privado. Dessas experiências, podem ser citadas o Conjunto
Residencial Jardim Jaçanã e o Conjunto Residencial
Ulisses Guimarães, ambos construídos na cidade
de Belém, no Estado do Pará.
3.
CONJUNTO RESIDENCIAL JAÇANÃ
Inserido em
uma área de uso predominantemente habitacional, na
qual as edificações apresentam, em sua grande
maioria, gabaritos abaixo de 6 metros, o Conjunto Residencial
Jardim Jaçanã é um conjunto residencial
cuja morfologia integra-se na paisagem existente e que busca,
através de suas formas, o equilíbrio entre o
bem estar físico e social de seus moradores, equilíbrio
esse nem sempre conseguido nas iniciativas habitacionais oficiais
dos últimos anos.
O partido
urbanístico utilizou o mais natural e elementar princípio
das aglomerações habitacionais: "Frente
com frente, fundo com fundo". Conforme mencionado anteriormente,
a história das cidades tem mostrado que a convergência
de edificações em torno de áreas livres
comuns, além de valorizá-las espacialmente,
confere a elas, de uma forma natural, destinações
específicas, garantindo seu uso, e, em conseqüência,
sua vida. Portanto, as ruas e a praça do conjunto não
surgiram, exclusivamente, como espaços residuais não
edificados. A conformação desses elementos não
obedeceu, apenas, à implantação dos blocos,
mas determinou, também, suas localizações.
As áreas livres, aqui, foram intencionalmente desenhadas
pela volumetria dos edifícios, de forma que suas características
físicas pudessem contribuir para a vida coletiva de
seus usuários.
O conjunto
foi construído em um terreno de 0,63 ha e integra 56
unidades assim distribuídas: 12 apartamentos de 1 quarto,
cada um com área total de 43.31 m²; 22 apartamentos
de 2 quartos, cada um com área total de 57.36 m²;
22 apartamentos de 3 quartos, cada um com área total
de 73.24 m2.
A Área
total edificada foi de 4.054,92 m2, resultando em Índice
de Aproveitamento de 0,63. O Índice de Ocupação
alcançou 0,31, estimando-se uma densidade de 387 hab/ha.
Figura 4 –
Conjunto Residencial Jaçanã
3.1
Tipologia Urbana
O conjunto
residencial é constituído de tipologias horizontais,
utilizando-se dois níveis para dispor as habitações,
geminadas lateralmente, semelhantes às vilas. Existem
quatro blocos de unidades, posicionados de modo a relacioná-los
com o entorno, e, também, a criar áreas naturais
de convivência no seu interior. O Bloco 1 volta-se para
a rua externa ao conjunto, sendo o principal responsável
por sua integração à circunvizinhança.
Os demais blocos (2,3 e 4) abrem-se para dentro do complexo,
conformando os espaços de uso coletivo (ruas e praça).
3.2
Tipologia do Edifício e da Unidade
Para cada
grupo de quatro unidades, duas no térreo e duas no
pavimento superior, correspondem acessos que são individuais.
As habitações localizadas ao nível do
chão possuem quintal e são idênticas às
suas correspondentes do nível elevado.
3.3 Medidas de Conforto Ambiental.
O conforto
ambiental também foi um dos aspectos determinantes
na formulação da proposta arquitetônica
do conjunto. Preocupações com a ventilação
natural e a insolação, por exemplo, nortearam
o conceito e o posicionamento das edificações,
objetivando garantir suas adequações ao meio.
De forma geral,
todos os blocos são cobertos com telhas de barro -
consagradamente apropriadas ao clima equatorial - possuindo
aberturas acima do nível do forro para facilitar a
retirada do ar quente do ático. O predomínio
do branco nas cores das paredes externas, visou minimizar
a penetração da radiação solar
direta.
Com relação
à ventilação, houve um especial cuidado
no posicionamento dos blocos. Na distribuição
da implantação, 78.5% das unidades (Blocos 1,3
e 4) voltam-se para o leste ou norte, recebendo em suas fachadas
principais ventos de 1a e 2a dominâncias (leste e nordeste/sudeste)
e os demais 21.5% (Bloco 2) voltam-se para o oeste. As unidades
com orientação desfavorável, apesar de
não receberem os ventos dominantes em sua fachada principal,
são ventiladas através de suas fachadas dos
fundos.
No que se
refere à insolação, apenas o Bloco 2,
encontra-se em posição menos favorável,
com sua fachada principal direcionada ao sol poente. Porém,
esse plano será sombreado pela crescente vegetação
do canteiro imediata e intencionalmente posicionado à
sua frente, já que o reduzido gabarito das edificações
permite que qualquer árvore de pequeno porte, em pouco
tempo, esteja de tamanho suficiente para desempenhar, nesse
caso, e com sucesso, sua importante função –
sombrear aquela fachada.
Figura 4 –
Seção Esquemática do Conjunto residencial
Jaçanã, 1997, projetado por José Bassalo
Individualmente,
o partido em planta das unidades procurou apropriar o posicionamento
dos ambientes principais (sala e quarto do casal) à
situação onde são implantados, de maneira
que possam receber os ventos dominantes e protegerem-se do
sol da forma mais satisfatória possível.
As unidades
de 1 quarto têm seus ambientes principais (sala e quarto)
sempre voltados para o leste, não apresentando problemas
de arejamento. As unidades de 2 e 3 quartos, devido à
diversidade de implantações a que estão
submetidas, apresentam seus dormitórios voltados para
orientações simétricas (frente e fundos),
de forma que algum deles sempre receba os ventos dominantes,
nas três situações de orientação
onde estas unidades se implantam. O quarto principal, nesses
dois tipos de unidade, pode ser tanto o "da frente"
como o "dos fundos", já que suas áreas
são quase idênticas. A sala, quando voltada para
o oeste, na situação menos favorável,
é ventilada através de sua porta de comunicação
para a cozinha, nesse caso, de frente para o leste.
A localização
das aberturas dos ambientes, especificamente as portas e janelas,
procura estabelecer um direcionamento diagonal dos ventos,
objetivando que eles, ventos, ao passarem, atinjam a maior
porção possível dos recintos. As portas
de todos os ambientes possuem bandeiras em venezianas, a fim
de garantir a entrada e saída da ventilação.
3.4
Medidas de Redução de Custos
A adoção
da tipologia horizontal justificou-se não apenas pelas
razões já expostas, mas, também, pela
necessidade de reduzir custos. A solução horizontalizada
(em dois níveis apenas), demandou fundações
superficiais e, portanto pouco dispendiosas. A distribuição
geminada das unidades também possibilitou menor despesa
de construção, pois o uso de paredes meeiras
e instalações coletivas, por exemplo, proporcionou
economia de material e de mão de obra.
O custo final
do conjunto, entre infra-estrutura e edificações,
totalizou R$1.263.973,79 o que significa R$311,71/m2 de área
edificada, e as unidades foram comercializadas a um preço
médio de R$437,12/m2. Como se observa, o empreendimento
proporcionou lucro financeiro aos cofres públicos,
além dos dividendos sociais que a venda de imóveis
pela metade do preço dos negociados pelo mercado imobiliário
privado trouxe ao governo.
4.
CONJUNTO RESIDENCIAL ULISSES GUIMARÃES
A COHAB do
Estado do Pará sugeriu, no edital publicado, que as
habitações fossem distribuídas em blocos
de três pavimentos, podendo os térreos serem
ocupados em no máximo 50% para unidades. Essa tipologia
permite que se busque adensamento, a partir da verticalização
das habitações, sem aumento excessivo dos custos
de execução. A colocação de apartamentos
no térreo, apesar de se constituir em um obstáculos
à passagem dos ventos pelo “efeito pilotis”
e prejudicar a privacidade das unidades térreas, apresentou-se
como única alternativa para atender à demanda
das famílias que possuíssem membros com limitações
físicas que pudessem impedi-los de subir escadas.
Fonte: BASSALO,
1997
Figura 6 – Conjunto Residencial Ulisses Guimarães
Foram alocadas na área fornecida um total de 204 unidades,
distribuídas da seguinte forma: 58 unidades de 3 quartos
com área útil de 52,40 m² (28,43%); 100
unidades de 2 quartos com área útil de 43,21
m² (49,01%); 46 unidades de 1 quarto com área
útil de 31,46 m2 (22,56%).
A área total construída foi de 14.410,44 m²,
a área total projetada foi de 3.602,61 m², enquanto
o índice de ocupação alcançado
foi de 0,14 sendo que o índice de aproveitamento chegou
a 0,58
4.1 Tipologia Urbana
A utilização de blocos com tamanhos variados,
implantados sob orientações diferentes, contemplou
a possibilidade de mudar a imagem dos conjuntos habitacionais
tradicionais. A idéia de padronização
de unidades implantadas uniformemente por eles consolidadas
sob justificativas econômicas e até mesmo conceituais,
conduz ao anonimato individual ou coletivo historicamente
rejeitado pelo homem. Portanto o projeto objetivou, a exemplo
de diversas outras experiências já existentes,
criar um conjunto que pudesse ser lido como um lugar com identidade
própria, e que possuísse lugares também
identificáveis dentro de si.
Além das ruas (todas com 6,00 m. de leito carroçável
e calçadas de 1,20 m.) e dos edifícios, destacam-se
três elementos urbanos existentes no conjunto: a praça,
o parque e a área de lazer. A praça, normalmente
lançada em espaços residuais, nos tradicionais
conjuntos, foi posicionada na frente do conjunto para ser
um elemento de integração entre este e a rua.
A praça atua como marco dos acessos a essa área
e sua localização possibilitará que seja
freqüentada por habitantes não apenas dos novos
blocos, mas, também, de toda a redondeza, o que garantirá
uma permanente vitalidade a esse espaço. O parque foi
posicionado mais para o interior do conjunto já que
se destina ao público infantil, ficando protegido por
dois blocos e por duas vias locais, assegurando proteção
às crianças que dele se utilizem. A área
de lazer foi composta basicamente por um campo de futebol,
uma quadra polivalente e duas quadras de vôlei e localiza-se
nos fundos do terreno. Esse posicionamento tem como justificativa
não apenas a tentativa de isolar essa área a
qual constitui-se, inevitavelmente, fonte de poluição
sonora, como também afastar ao máximo os blocos
habitacionais do Colégio Madre Celeste (vizinho dos
fundos), para que não haja incômodos recíprocos.
n
Fonte: BASSALO, 1997
Figura 7 – Conjunto Residencial Ulisses Guimarães
- Implantação Urbana
4.2 Tipologia do Edifício e da Unidade
Os condomínios foram formados tomando-se como referência
a escada, ou seja devem ser considerados como ambientes de
cada bloco uma portaria, um depósito de lixo, a escada,
e as unidades habitacionais por ela servidas. Nos blocos onde
houver mais de uma escada deverão ser considerados
como conjunto de blocos geminados. Todos os estacionamentos
são externos, o que libera o térreo das edificações
não apenas para o lazer, como também para o
adensamento do conjunto, se assim a COHAB o decidir.
4.3 Medidas de Conforto Ambiental
O partido em planta, conforme já se mencionou, permitiu
arranjos diversos e uma composição de blocos
de tamanhos variados. Essa irregularidade de tamanho dos blocos
foi a estratégia para se tentar garantir a penetração
dos ventos por toda a extensão do conjunto.
Procurou-se implantar os blocos de menor tamanho nas extremidades
do terreno voltadas para os sentidos das dominantes da ventilação,
para que esta pudesse passar pelos espaços entre eles
e atingir os outros blocos no interior do conjunto, blocos
esses de maior extensão. Também se procurou
liberar os pilotis dos blocos menores igualmente para facilitar
a penetração dos ventos.
A orientação dos blocos sugerida pela COHAB
foi seguida à risca pelo projeto, variando-se o eixo
longitudinal de 20 a 30 graus em relação ao
eixo LESTE-OESTE, tanto no sentido horário como no
anti-horário. Essa variação de direção
não apenas possibilitou satisfatória ventilação
nas diversas dominantes do conjunto como um todo, com os blocos
podendo receber ventilação através das
duas fachadas longitudinais, como, também, proteger
as áreas teoricamente mais nobres (salas e quartos)
da insolação vespertina.
4.4 Medidas de Redução de Custos
A variação do posicionamento dos blocos não
se deve apenas às questões de conforto ambiental.
Também utilizou-se a rotação dos blocos
como uma forma de conseguir o maior número possível
de unidades sem prejudicar as condições de habitabilidade
(privacidade, salubridade, etc.). Além disso, procurou-se
reduzir a extensão de áreas pavimentadas ao
mínimo como forma de economia de custos e de maximização
das áreas verdes.
O custo final levantado, para a construção das
edificações, foi de R$ 258,15.
5. ANÁLISE COMPARATIVA
Ambos os conjuntos residenciais foram concebidos e construídos
na última década do século XX e representam
a intenção do governo estadual local em adotar
algumas inovações no que diz respeito à
melhoria do conforto social dos futuros moradores. Ao mesmo
tempo, o projeto para as habitações teve como
objetivo fundamental a alocação do maior número
possível de famílias, em unidades que apresentassem
condições aceitáveis de habitabilidade
e que pudessem ser produzidas a um custo que permitisse a
comercialização a preços compatíveis
com o poder aquisitivo da faixa de mercado a que se destinaram.
Percebe-se, porém, que o Conjunto Residencial Jaçanã
apresentou uma melhor solução no que se refere
ao conforto social. Como no exemplo de Ernst May, anteriormente
citado, a conformação de um pátio central
foi bem sucedida quanto aos seus principais propósitos
explícitos. A praça e a quadra são, em
si, aglutinadoras permitindo o desejado convívio social.
Ademais, o ambiente aberto, cercado pelos blocos bem assentes
sobre tiras ajardinadas e o movimento dos telhados, somados
ao branco predominante e mais o colorido leve das faixas que
delimitam as entradas, configuram uma arquitetura que se apresenta
bastante confortável.
Na avaliação pós-ocupação
realizada pela COHAB, não há indicações
precisas quanto ao conforto social, mas há um item
denominado de ”implantação e atividades
do condomínio”, que foi considerado pelos moradores
da seguinte forma: 34,15% como “bom”, 24,39% como
“razoável” e 14,63% como “precário”.
O Conjunto Residencial Ulisses Guimarães também
representa sinais de mudança para uma arquitetura socialmente
mais confortável, embora não alcance o mesmo
objetivo do outro conjunto no que se refere a um efetivo convívio
social.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Através deste artigo buscou-se mostrar que o adensamento
horizontal nos pode oferecer uma alternativa tipológica
válida também para a produção
habitacional voltada à população de menor
renda. O Conjunto Residencial Jaçanã merece
ser destacado como exemplo de uma tentativa de melhorar o
ambiente extra-muros. Não foi possível, nos
limites deste trabalho, responder se existe conforto social
nesse conjunto, pois isso só se tornaria possível
realizando uma avaliação pós-ocupação
mais abrangente. Todavia, pode-se afirmar que o conjunto responde
positivamente como objeto facilitador do conforto social,
porque tem sua área comum maximizada e bem localizada,
valorizada como espaço semi-público útil
e confortável e um lugar servido pelo bom tratamento
estético de seu entorno, formado pelo desenho alegre,
leve e movimentado das fachadas.
Para isso, recorreu-se a uma forma de agrupamento historicamente
consagrada, posicionando as edificações voltadas
umas para as outras, em torno de um espaço público.
Essa implantação, como qualquer outra, apresenta
pontos positivos e negativos. Se por um lado prejudicou-se,
de certa forma, uma minoria das habitações implantando-as
de forma inadequada, com sua fachada principal voltada para
o sol poente, de onde as rajadas de vento são quase
inexistentes, por outro beneficiou-se a vida extra-muros,
a vida coletiva de todos, pois a convergência das edificações
para os espaços de uso comum, garante que estes atuem
como aglutinadores sociais, já que a vida de seus habitantes
transcenderá do individual ao coletivo sempre para
um mesmo lugar.
Dessa forma, embora o conjunto em questão se distancie,
fisicamente, dos tradicionais arquétipos de habitação
social, sua política de produção e destinação
o credencia como tal, porque, ao ser comercializado a preços
abaixo dos praticados no mercado imobiliário privado,
contempla uma numerosa população de limitado
poder aquisitivo.
O conceito espacial do empreendimento não traduziu,
somente, o cuidado com o panorama financeiro das fases de
sua produção e comercialização,
estendendo-se à etapa de sua ocupação
e uso. A forma urbana do conjunto, entre outros aspectos,
privatiza, em forma de quintais, os espaços que não
possuem uso público específico (ruas e praça,
por exemplo), reduzindo as áreas geridas pela coletividade
e atenuando, com isso, seus custos de manutenção.
O conforto ambiental, juntamente com outros fatores então
mencionados, foi um dos aspectos determinantes na formulação
da proposta arquitetônica do conjunto. Preocupações
com a ventilação natural e a insolação,
por exemplo, nortearam o conceito e o posicionamento das edificações,
objetivando garantir suas adequações ao meio.
O adensamento horizontal e o bom tratamento das áreas
livres, sejam estas espaços públicos, semi-públicos
ou privados, vem ao encontro das necessidades da população
(ou de significativa parcela dela), e constitui-se em iniciativa
que deveria ser uma atividade cotidiana da administração
pública e não apenas episódica como se
tem apresentado.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BASSALO, J. Projeto Residencial Jardim Jaçanã.
CD-ROM. Belém, 1997.
BOTT, H. e HAAS, V. Verdichteter Wohungsbau. Stuttgart: Kohlhammer,
1996.
HERTZBERGER, H. Lições de Arquitetura. São
Paulo: Martins Fontes, 1999.
ROSSI, A.M.G. Novos Conceitos em Tipologia e Tecnologia na
Construção Habitacional com Apoio Governamental:
uma Comparação entre Brasil e Alemanha. Tese
de Doutorado. COPPE/UFRJ. Rio de Janeiro, 1999.
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